Apesar da detecção de atividade elétrica cerebral desde 1875, foi somente a partir
de 1929 que o EEG humano foi demonstrado inequivocamente.
O EEG compreende oscilações de potencial elétrico que ocorrem continuamente entre
regiões monitoradas do couro cabeludo, através de eletrodos acoplados a sistemas
amplificadores e registrados. O registro pode ser feito por oscilógrafos com inscrições
a tinta, nos parelhos mais antigos, e por digitação dos sinais analógicos apresentados
em monitores, nos aparelhos mais modernos (EEG digital).
Alterações da atividade elétrica cortical podem sugerir tipos específicos de
epilepsia, tumores, encefalopatia metabólica etc. A evidência de associação entre
atividade paroxística e epilepsia foi verificada precocemente, quando se observou que
descargas elétricas anormais não correspondiam necessariamente a crises clínicas do
paciente.
Estudos intensivos sobre a atividade elétrica neuronal em modelos experimentais de
epilepsia trouxeram esclarecimentos fundamentais. Fenômenos peculiares ocorrem nas
membranas dos neurônios situados em áreas epileptogênicas. Uma elevada despolarização
da membrana neuronal seguida por trens de alta frequência de potenciais de ação é
gerada por mecanismos sinápticos e não-sinápticos. Segue-se um período de
hiperpolarização prolongada de membrana. Observa-se uma sincronização anormal de
disparo neuronal nas áreas focais epilépticas, contando com a participação de diversos
neurônios na geração da alteração paroxística de despolarização.
Os paroxismos registrados no EEG provavelmente reflete a sequência de eventos:
despolarização-hiperpolarização-sincronização. Deve-se noentanto salientar que
potenciais epileptiformes podem ocorrer em indivíduos não epilépticos.
A atividade paroxística interictal é um fenômeno populacional neuronal subcrítico,
que a partir de um limiar propaga-se para alem do grupo de células inicialmente geradora
do fenômeno. O recrutamento celular pode envolver áreas corticais e subcorticais e a
geração de uma crise clínica não parece depender do tempo de despolarização ou do
grupo celular envolvido.
Registro do EEG
O Sistema Internacional 10-20 é especialmente recomendado por ser aceito e usado no
mundo todo. Com o uso mais frequente de EEG digitais, o envio de data através de arquivos
entre diversos centros exige a standardização do método de registro. Os eletrodos são
colocados em distância padrão entre si, havendo é claro, as variações pertinentes ao
tamanho da cabeça do paciente. Eletrodos colocados na linha média são denominados
"zero"ou "z"ou ainda "0". Eletrodos colocados no hemicrânio
esquerdo tem números ímpares, e à direita, tem números pares. Assim, por exemplo F4 é
frontal direito, F3 frontal esquerdo e Fz ou F0 é frontal na linha média. Em casos
especiais, especialmente aqueles com finalidade acadêmica, podem requerer um maior
número de eletrodos em regiões cuja atividade precise ser melhor caracterizada
(geralemente temporal). Eletrodos de referência podem ser usados nos lobos das orelhas.
Para o registro do EEG, o paciente deverá estar sem brincos ou objetos de metal, com
os cabelos secos e o escalpe limpo. Cabelos longos devem ser presos de forma a exibir o
couro cabeludo. O ambiente de registro deve ser calmo, silencioso, sem luzes intensas, sem
movimentos de pessoas passando e sem interferência eletro-eletrônica. A aparelhagem deve
ser mantida muito limpa e frequentemente calibrada. O uso de pastas especiais para
aderência de eletrodos ao escalpe, e filtros para registro da atividade elétrica devem
ser feitos de forma sistematizada. Movimentos oculares e contratura muscular são causas
frequentes de artefatos que por vezes impedem a avaliação do traçado.
O registro é feito em repouso, com olhos fechados. Estímulos diferentes podem ser
usados durante o exame, sendo mais comuns: abertura dos olhos, hiperpnéia voluntária
(particularmente útil para desencadear crises de ausência nos casos de Petit Mal),
audioestimulação e fotoestimulação intermitente (particularmente útil para
desencadear crises mioclônicas em casos de Epilepsia Mioclônica Juvenil). EEG de sono,
de privação de sono, ou de outras situações específicas pode ser necessário para
determinados pacientes.
Frequência de ondas (ciclos/seg = Hz):
Delta - menor que 3.5 ciclos/seg
Teta - 4 - 7 ciclos/seg
Alfa - 8 - 13 ciclos/seg
Beta - acima de 13 ciclos/seg
Outras letras gregas (Lambda e Mu) são usadas para designar padrões especiais de
ondas, ainda que numa frequência como as descritas acima.
Amplitude de ondas:
EEG denota variação da voltagem no tempo. A voltagem registrada determina a amplitude
da onda, e uma escala é necessária no traçado. A medida de voltagem de cada onda é
ineficaz, sem finalidade prática e sujeita a erros. Geralemente a amplitude é
considerada baixa, média ou alta, após uma avaliação geral do traçado. Amplitudes
altas são frequentes em crianças, durante a hiperpnéia, e em ritmos de frequência
inferior a 13Hz. Amplitudes baixas são registradas em situações de ansiedade, dor, e
por vezes lesões cerebrais importantes. A interpretação dos achados na variação de
amplitude é muito importante devido ao grande número de situações que podem acarretar
tal variações.
Ritmo Alfa:
Ondas de 8-13 Hz, amplitude média de 50mV, predominantes na região posterior do
cérebro, durante o repouso com olhos fechados. Este ritmo se estabelece por volta dos 3
anos de idade. As ondas são sinusoidais, arredondadas, embora alguns indivíduos as
apresentem de forma mais aguda. Alguns pacientes apresentam ritmo alfa em praticamente
todas as regiões cerebrais, até mesmo nas áreas frontais, porem o mais comum é se
observar Alfa nas áreas posteriores ao vertex.
Abertura dos olhos, influxo de luz e atividade mental são estímulos que bloqueiam ou
pelo menos atenuam a atividade alfa. Tambem é interessante observar que se o indivíduo
apresenta bloqueio alfa com a abertura dos olhos, mas continua olhando para um ponto fixo
por algum tempo, a atividade alfa retorna com os olhos abertos. Desviando o olhar para
algum ponto que lhe chame a atenção, o bloqueio alfa retorna.
Alfa é o ritmo típico do repouso com olhos fechados, durante a vigília. Nos estados
de sonolência, este ritmo tende a desaparecer, e apenas curtos surtos de ritmo alfa são
observados a intervalos cada maiores.
O ritmo alfa já foi relacionado a grau de inteligência e tipos de persoanlidade, mas
é difícil estabelecer um parâmetro e variações interindividuais são comuns.
Variações intraindividuais são tambem observadas e até mesmo o período do ciclo
menstrual pode determinar alterações da frequência e amplitude alfa.
Ritmo Beta:
Ondas com frequência maior que 13/seg. Devido às limitações do registro, 50 a
70c/seg costuma ser o máximo registrado, mas é raro observar-se beta a esta frequência.
A frequência máxima costuma ser 35c/seg. A amplitude é geralmente menor que 30mV.
Adultos em vigília apresentam atividade beta principalmente nas regiões anteriores do
cérebro. Alguns medicamentos e o sono podem aumentar a frequência das ondas beta de um
indivíduo. Distúrbios psiquiátricos por vezesc ursam com ondas beta generalizadas, de
alta frequência.
Ritmo Teta:
Ondas na frequência 4,0 a 7,7Hz, comum em crianças, adultos em estado de sonolência
e sono, ou aparecendo ocasionalmente em surtos de curta duração nas regiões
parieto-occipitais em adultos jovens normais.
Na região frontal, o ritmo teta pode aparecer durante atividade metal (ex, cálculos
matemáticos). Quando assimétrica ou constante, a atividade Teta pode sugerir disfunção
em determinada área cerebral.
Ritmo Delta:
Ondas lentas, geralmente de grande amplitude, mais comum na forma intermitente. É um
ritmo comum em crianças pequenas, recem-nascidos, e encontrado durante o sono. Durante a
hiperpnéia voluntária, podem ser observados surtos de ondas delta generalizados, uma
resposta fisiológica do sistema nervoso central à variação de pCO2.
Atividade Delta em surtos, desorganizando o traçado de base, pode ser observada em
diversas patologias inflamatórias, infecciosas, e intoxicações por drogas.
Anormalidades inespecíficas do EEG:
Sinais de disfunção cerebral não específica podem ser observados no EEG, e somente
junto com a história clínica e achados ao exame neurológico, uma inerpretação destes
achados poderá ser feita. De modo geral, as anormalidades inespecíficas denotam:
- atividade lenta intermitente e generalizada: disfunção cerebral por patologia que
atinge o cérebro como um todo, ex. hemorragia subaracnóide e doenças degenerativas.
- anormalidades bilaterais persistentes: alteração do tronco, geralmente associada à
alteração da responsividade e do nível de consciência.
- anormalidade focal: distúrbio cerebral localizado.
Anormalidades paroxísticas do EEG:
Podem ser ictais ou interictais. Costumam se iniciar por alterações na frequencia do
traçado, denotando que um novo evento eletrofisiológico está ocorrendo. A alteração
de frequencia pode ocorrer tambem com alteração da amplitude das ondas, por rápidas
quedas ou incrementos de voltagem. São apresentadas a seguir apenas as mais
frequentemente encontradas nos exames de eletroencefalografia na prática diária. Vale
ressaltar que descargas paroxísitcas no EEG são indicadores de um desvio do
comportamento neuronal que pode ou não estar relacionado a crises epilépticas.
Atividade Ponta (Spike): atividade de duração menor que 70ms, geralmente negativa, de
amplitude variável, que alteram o traçado de base. A amplitude da ponta não está
necessariamente relacionada à seriedade deste achado.
Atividade Onda-Aguda (Sharp Wave): onda aguda claramente distinta da atividade de base,
de duração 70-200ms. Pontas e ondas agudas são fenômenos neurofisiológicos
semelhantes e podem ocorrer em pacientes sem história de epilepsia.
Atividade Poliponta: complexo de atividade eletroencefalográfica onde duas ou mais
pontas acontecem em sequencia. Podem estar associados a mioclonias de origem epiléptica e
em Síndrome de Lennox-Gastaut.
Atividade Ponta/Onda: denota despolarização rápida de um grupo neuronal, seguida de hiperpolarização lenta. De acordo com a frequencia destes complexos, podem ser característicos de determinadas patologias. Por exemplo, ponta/onda 3 ciclos/seg de aparecimento difuso, é característico da Epilepsia do tipo Ausência (Petit Mal). Ponta/onda 2 a 2,5 ciclos/seg em região frontal é tipicamente encontrado nos casos de S. Lennox-Gastaut.