Questão 01:

A área de todo o córtex cerebral da qual com mais facilidade se podem obter movimentos motores é a área piramidal, que se situa, sobretudo, no giro pré-central, mas vai, em ligeira extensão, até o lábio anterior do giro pós-central. Essa área é habitualmente chamada córtex motor.

Um choque único aplicado no córtex motor, às vezes, causa um movimento motor; por exemplo um estalido de um dedo, ou o desvio do lábio, ou algum movimento distinto semelhante. E uma série breve de estímulos quase sempre dá lugar a movimento em alguma parte distinta do corpo.

Os diferentes grupos musculares do corpo não estão representados no mesmo grau no córtex motor. Em geral, o grau de representação é proporcional à individualidade do movimento solicitado da parte respectiva do corpo. Assim, o polegar e os dedos em geral têm representações muito grandes, conforme se dá também para os lábios, língua e cordas vocais. Quando se usam estímulos apenas limiares, só pequenos segmentos da musculatura periférica se contraem de uma vez. Nas regiões dos dedos e do polegar, que têm representação enorme no córtex, estímulos limiares podem fazer com que músculos singulares ou por vezes até fascículos singulares de músculo se contraiam, ilustrando assim o alto grau de controle que é exercido por essa porção do córtex. Por outro lado, estímulos limiares na região do tronco podem fazer com que até 30 a 50 pequenos músculos se contraiam simultaneamente, assim ilustrando que o córtex motor não controla músculos distintos do tronco, mas, ao contrário, controla grupos de músculos.

Se bem que a simples estimulação limiar de pontos diversos do córtex motor possa fazer que porções relativamente reduzidas da musculatura se contraiam individualmente, uma estimulação mais moderada quase sempre causa contração coordenada de vários músculos diferentes simultaneamente. Além disso, a estimulação de dada área faz com que um membro ou outra parte do corpo se movimente para, praticamente, a mesma posição final, seja qual for sua posição original. Isso foi demonstrado em macacos normais não anestesiados, nos quais se haviam implantado eletrodos na área correspondente a um membro. Cada vez que se aplicava um estímulo, fosse qual fosse a posição inicial do membro, este sempre se movimentava para dada posição. Assim, a estimulação de certo ponto do córtex motor fazia o antebraço levantar-se e a mão torcer-se para fora. A transferência do estímulo para ponto ligeiramente diferente causava posição final ligeiramente diferente, interessando, principalmente, a mesma musculatura, mas recrutando musculatura adicional para a nova posição e abandonando parte da musculatura original. Dessa forma, a estimulação de uma série de pontos de um lado a outro da superfície do córtex motor pode, teoricamente, fazer com que um membro se movimente de uma posição final para a seguinte, daí para a seguinte, depois para a seguinte, de modo que cada posição final acabe por ser ligeiramente diferente da anterior. Assim, é possível realizar uma seqüência de movimentos.

Quando observamos os registros do comportamento da atividade das células do córtex motor, concluímos que quando o movimento é realizado, começa a haver uma intensa descarga de impulsos nervosos. Ao contrário, quando o músculo está em repouso, o registro permanece estável, representado no papel como uma linha reta. Podemos observar também que quanto maior é a força exercida pelos músculos (no caso em que se realizaram experimentos variando a carga levantada pelos músculos), mais intensa é a atividade elétrica registrada pelas células. Podemos então concluir que é a freqüência e intensidade dos disparos de impulsos nervosos que determinam a força exercida pelos músculos.

 

 

Questão 02:

O cerebelo só funciona em associação com atividades motoras iniciadas em algum local do sistema nervoso central. Essas atividades podem iniciar-se, originalmente, na medula espinhal, na formação reticular, nos gânglios basais ou nas áreas motoras do córtex cerebral.

Quando descem impulsos motores do córtex cerebral, através do trato corticospinhal, para excitar os músculos voluntários, transmitem-se impulsos colaterais, simultâneamente, ao cerebelo, através dos tratos pontocerebelares; esses impulsos vão, principalmente, aos hemisférios cerebelares, mas também, até certo grau, ao cerebelo anterior. Portanto, para cada movimento motor que se executa, não só os músculos recebem sinais ativadores, mas o cerebelo recebe sinais semelhantes, ao mesmo tempo.

Quando os músculos respondem aos sinais motores, os fusos musculares, os aparelhos tendinosos de Golgi, os receptores das articulações e outros receptores periféricos transmitem impulsos para cima, principalmente através das vias espinocerebelares constituídas pelas colunas dorsais; impulsos que terminam no cerebelo anterior. Além disso esses impulsos vão à mesma porção, exatamente, do cerebelo anterior que é estimulada pelos impulsos descendentes provenientes do córtex motor.

Depois que os sinais provenientes da periferia e aqueles provenientes do córtex motor estão integrados, os impulsos eferentes são transmitidos do córtex cerebelar aos núcleos denteados; e então, sobem através dos núcleos ventro-laterais do tálamo, de volta ao córtex motor, onde se originou o estímulo.

É fácil perceber que o circuito acima descrito representa um circuito de retroalimentação complexo, começando no córtex motor e também voltando ao córtex motor. Além disso as experiências têm mostrado que o cerebelo opera quase da mesma maneira que um servomecanismo, tal como se usa em sistemas industriais de controle, ou em sistemas de piloto automático. Isto é, o cerebelo compara as intenções do córtex com a execução pelas partes do corpo. Se as partes não se moveram de acordo com as intenções do córtex, o erro entre umas e outras é calculado pelo cerebelo, de modo que se podem fazer correções apropriadas e imediatas. Assim, se o córtex tiver transmitido um sinal a fim de que o membro se desloque para determinado ponto, mas o membro começa a deslocar-se depressa demais e, evidentemente, está para ultrapassar o ponto de intenção, o cerebelo pode iniciar impulsos freadores a fim de retardar o movimento do membro e detê-lo no ponto de intenção.

Habitualmente, o córtex motor transmite muito mais impulsos do que são necessários para executar cada movimento pretendido; o cerebelo, pois, tem de funcionar para inibir o córtex motor no momento apropriado, depois que o músculo começou a movimentar-se. O cerebelo, automaticamente, avalia a freqüência de movimento e calcula a extensão de tempo que será necessária para alcançar o ponto de intenção. Então, transmitem-se impulsos inibitórios apropriados ao córtex motor para inibir o músculo agonista e excitar o músculo antagonista. Dessa forma, aplicam-se freios apropriados para deter o movimento no ponto exato da intenção.

Experiências realizadas mostraram duas importantes características do sistema de retroalimentação cerebelar:

1. Quando uma pessoa executa certo ato, tal como transferir peso avultado, rapidamente, para outra posição, a princípio ela não pode julgar o grau de inércia que o movimento envolverá. Portanto, ela quase sempre ultrapassa o ponto de intenção, à primeira tentativa. Entretanto, após várias tentativas, ela pode deter o movimento no ponto exato. Isso demonstra que o conhecimento aprendido da inércia do sistema é feição importante do mecanismo de retroalimentação cerebelar.

 

2. Quando se faz um movimento rápido para um ponto de intenção, o músculo agonista contrai-se fortemente, durante todo o início da série de movimentos. Depois, subitamente, pouco antes de alcançar-se o ponto de intenção, o músculo agonista se torna completamente inibido, enquanto que o músculo antagonista se torna fortemente excitado. Além disso, o ponto onde ocorre essa inversão de excitação depende da freqüência do movimento e do conhecimento previamente aprendido da inércia do sistema. Quanto mais rápido o movimento e maior a inércia, mais cedo aparece o ponto de inversão na série de movimentos.

 

Esses acontecimentos acontecem com demasiada rapidez para que o córtex cerebral inverta a ação voluntariamente. É evidente que a excitação do músculo antagonista, ao fim do movimento, é função inteiramente automática e subconsciente; não é contração deliberada da mesma natureza que a contração original do músculo agonista. Portanto, é quase certo que uma das principais funções do cerebelo seja a excitação automática de músculos antagonistas ao fim de um movimento, ao mesmo tempo que inibe músculos agonistas que o iniciaram.

 

 

Questão 03:

a) O vestibulocerebelo originou-se filogeneticamente no mesmo momento em que o aparelho vestibular se desenvolveu. Observa-se que lesões em partes específicas do cerebelo (principalmente perda dos lobos floculonucleares) causam perturbações extremas do equilíbrio e movimentos posturais.

Ainda podemos perguntar qual o papel que o vestibulocerebelo desempenha no equilíbrio que não pode ser feito por outro tipo de circuito neuronal do cérebro. Uma pista é o fato de que em pessoas com disfunção vestibulocerebelar, o equilíbrio é muito mais afetado durante a performance de movimentos rápidos que durante a imobilidade, especialmente quando esses movimentos envolvem mudança de direção do movimento do corpo que estimula os canais semicirculares. Isso sugere que o vestibulocerebelo é especialmente importante no controle do equilíbrio entre contrações de músculos agonistas e antagonistas do tronco, quadris e ombros durante mudanças rápidas da posição corporal, como requerido pelo aparelho vestibular.

Um dos principais problemas em controlar o equilíbrio é o tempo requerido para transmitir sinais de posição e velocidade do movimento das diferentes partes do corpo para o cérebro. Mesmo considerando-se a condução sensorial mais rápida (que é de 120 m/s), a demora da transmissão do pé para o cérebro é de 15 a 20 milissegundos. Os pés de uma pessoa correndo rápido são capazes de se deslocar até 30 cm durante esse tempo. Assim, nunca será possível que o sinal das partes periféricas do corpo atinjam o cérebro ao mesmo tempo que os movimentos realmente ocorrem. Como, então, é possível para o cérebro saber quando parar um movimento para iniciar a próxima seqüência de atos, especialmente quando os movimentos são rápidos? A resposta é que os sinais da periferia informam o cérebro não somente posições das diferentes partes do corpo, mas também qual a rapidez e direção em que estão se movendo. Acredita-se que a função do vestibulocerebelo é calcular a partir desses dados onde as diferentes partes do corpo estarão nos próximos milissegundos. Os resultados desses cálculos são a chave para que o cérebro prossiga com o próximo movimento seqüencial.

Assim, durante o controle do equilíbrio, presume-se que a informação do aparelho vestibular é usada num típico circuito de feedback para promover correções praticamente instantâneas dos sinais psturais motores necessários para a manutenção do equilíbrio, mesmo durante movimentos extremamente rápidos, incluindo rápidas mudanças de direção. Os sinais de feedback de áreas periféricas do corpo ajudam no processo. O papel do vestibulocerebelo é ajudar os núcleos cerebrais vestibular e reticular a computar a posição requerida pelas respectivas partes do corpo em qualquer tempo, não importando o atraso da periferia ao cerebelo.

 

b) Os mecanismos responsáveis pela manutenção da postura e equilíbrio são três: a visão, a propriocepção e o aparelho vestibular. A visão é responsável pela localização espacial da pessoa. É através dela que temos noção de distância, velocidade e movimento em relação ao mundo exterior. Além disso ela ajuda na percepção de movimentação das partes do corpo (como membros, mãos, pés, etc.). A propriocepção é o sentido dado por receptores presentes nos músculos. Eles informam o cérebro da posição, grau de contração e tensão de cada músculo do corpo. Assim, temos a noção de "onde" está cada um de nossos membros em cada instante. O aparelho vestibular é o órgão do equilíbrio propriamente dito. Os canais semicirculares informam qual a posição da cabeça em relação ao chão. É o sentido mais importante para a manutenção do equilíbrio.

Para manter o equilíbrio e controlar a contração dos músculos agonistas e antagonistas, o cérebro conjuga informações desses três sentidos, interpretando qual a melhor maneira de manter a posição desejada.

 

 

Questão 04:

A doença de Parkinson, conhecida também como paralysis agitans, resulta de destruição disseminada da parte da substância nigra que manda fibras nervosas secretoras de dopamina para o núcleo caudado e putâmen. Essa doença caracteriza-se por:

· rigidez de parte (senão da maior parte) da musculatura corporal;

· tremor involuntário das áreas envolvidas mesmo quando a pessoa está em repouso a intervalos regulares de 3 a 6 ciclos por segundo;

· séria dificuldade em iniciar movimentos.

As causas desses efeitos motores anormais são quase inteiramente desconhecidos. Entretanto, se a dopamina secretada nos núcleos caudados e putâmen funciona como um transmissor inibitório, então a destruição dos neurônios dopaminérgicos da substância nigra teoricamente permitiria que os núcleos caudados e a substância nigra se tornassem mais ativos que o normal e possivelmente isso causaria disparos contínuos de sinais excitatórios para o sistema de controle motor corticospinhal. Essa sobrecarga de sinais pode certamente excitar todos ou quase todos os músculos do corpo acima do normal, levando à rigidez. Alguns dos circuitos de feedback podem facilmente oscilar por causa dos grandes ganhos de feedback após a perda da inibição, levando ao tremor da doença de Parkinson. Esse tremor é ligeiramente diferente daquele resultante de doença cerebelar porque este ocorre durante todo o tempo de vigília e por isso é chamado de tremor involuntário, em contraste com o tremor cerebelar, que ocorre somente quando a pessoa realiza movimentos intencionalmente iniciados, sendo por isso chamado de tremor intensionado.

Atualmente usam-se dois tipos de drogas para combater a doença de Parkinson: a L-Dopa e o L-Deprenil. As duas substâncias agem no sentido de aumentar os níveis de dopamina e, desse modo, devolver o equilíbrio entre inibição e excitação nos núcleos caudados e putâmen. Porém, tratamentos com essas drogas conseguem no máximo melhorar a qualidade de vida dos doentes, amenizando os sintomas, mas não chega a curá-los.

Atualmente, vários experimentos têm demonstrado que o transplante de células secretoras de dopamina nos núcleos caudados e putâmen (células obtidas de cérebros de fetos abortados) pode ser usado com algum sucesso no tratamento da doença de Parkinson. Entretanto, as células não persistem por mais de alguns poucos meses. Se essa persistência for alcançada, esse pode tornar-se o tratamento do futuro.