A região de contato entre o nervo motor e a fibra muscular esquelética é altamente
especializada, com características estruturais próprias. O nervo motor, ao se aproximar
da fibra muscular, perde a bainha de mielina e se ramifica. A fibra muscular, na região
da junção mioneural, apresenta circunvoluções na membrana. O transmissor químico
densta sinapse especializada é a acetilcolina.
Síntese de acetilcolina (Ach)
A nível da terminação dos neurônios motores colinérgicos, se dá pela acetilação da
colina, catalizada pela colina-acetiltransferase. O radical acetila é doado pela
acetilcoenzima A. Esta reação ocorre a nível de axoplasma e o transmissor é então
estocado nas vesículas grandes e claras da terminação pré-sináptica.
Liberação do mediador
Ach intravesicular é o transmissor liberado durante a transmissão de um impulso nervoso,
porem um "vazamento" constante de Ach pode ser observado na junção mioneural.
A nível da placa motora, a membrana apresenta pequenas despolarizações (0,5mV) sendo
estes potenciais conhecidos como "potenciais em miniatura da placa terminal".
Durante a liberação destas pequenas quantidades de transmissor, o efeito observado na
despolarização da placa é do tipo quântico, ou seja, um efeito somatório de unidades
de tamanho uniforme gera o potencial de placa terminal. Um quantum é a quantidade de Ach
necessária para gerar um potencial em miniatura, que corresponde à quantidade de Ach em
uma vesícula. Um estímulo elétrico poderia gerar quanta suficiente para a
despolarização.
Liberação de Ach no impulso elétrico
Para que a Ach seja liberada da vesícula, é necessário que esta se acople à membrana
pré-sináptica temporariamente, de tal forma que a vesícula libere seu conteúdo por
exocitose. Este acoplamento é dependente de cálcio e íons que competem com Ca++
diminuem significativamente a liberação de Ach na terminação. O impulso elétrico que
chega à região pré-sináptica aumenta a permeabilidade desta área ao calcio e a
entrada deste íon promove o acoplamento das vesículas à membrana e liberação de Ach
na fenda sináptica. As vesículas tem a tendência de se acoplar a áreas específicas da
membrana pré-sináptica, chamada de sítios ativos. Após a liberação do transmissor, a
vesícula é então recuperada e reciclada, para que se encha novamente de Ach.
O controle dos níveis intracelulares de calcio é delicado e mantido basicamente por 4
mecanismos:
1- proteínas axoplásmicas que se ligam ao calcio
2- sequestro de calcio por mitocôndrias e outras organelas
3- sequestro de calcio ATP-dependente
4- efluxo de calcio regulado pelo influxo de sódio
Ach na fenda sináptica
A concentração de Ach na fenda sináptica é modulada por dois mecanismos: hidrólise
enzimática e difusão simples. A hidrólise (muito mais importante e significativo) é
dada pela acetilcolinesterase, resultando em ácido acético e colina. Embora a Ach não
seja recapturada pelo neurônio pré-sináptico, a colina é recapturada e reutilizada.
Desta forma, a acetilcolinesterase é fundamental para a modulação dos efeitos da Ach
sobre os receptores.
Receptores de Ach
O receptor de Ach na placa motora é uma glicoproteína. O resíduo glicídico fica
exposto ao exterior e o receptor atravessa toda a membrana. Estes receptores estão
concentrados em áreas onde as vesículas se acoplam preferencialmente (sítios ativos).
A Ach promove transmissão neuromuscular por despolarizar a membrana até o limiar de
excitabilidade, gerando-se uma resposta propagada (potencial de ação) que promove a
contração muscular. Esta despolarização (única função da Ach) é atingida porque a
interação da Ach com o receptor promove um fluxo de íons para dentro da célula. A
ligação da Ach com o receptor promoveria uma momentânea abertura de canais que permitem
o fluxo unidirecional de sódio e potássio.
Influências tróficas
O motoneurônio exerce uma atividade trófica sobre o músculo, não mediada pelo impulso
nervoso em si, mas fundamental para a manutenção, estrutura e função das células
musculares.
As alterações decorrentes da denervação muscular esquelética permitem observar o
papel destas influências tróficas. Quando um músculo esquelético é denervado, logo se
observa uma queda no potencial de membrana e proliferação de receptores de Ach que
passam tambem a ser encontrados em regiões extra-juncionais. Potenciais de ação
espontâneos surgem (fibrilações) e segue-se um aumento da resistência da membrana da
fibra muscular (principalmente determinada pelo decréscimo da condutância ao potássio).
A atrofia muscular observada em músculos esqueléticos denervados é variável
dependendo do músculo em questão e da espécie animal estudada. A denervação promove
um decréscimo na velocidade de síntese de proteínas musculares e aumenta a velocidade
de sua degradação. As proteínas miofibrilares são as mais afetadas, havendo tambem
aparecimento de lisossomos, aumento do sistema retículo-endoplasmático e fragmentação
de mitocôndrias.
As alterações observadas na denervação e os estudos que buscam esclarecer quais
são estes fatores tróficos mostram que a Ach sozinha não deve ser o fator que media o
trofismo muscular esquelético. O impulso nervoso elétrico e a atividade muscular são
importantes para manutenção do trofismo, porem algum outro material com atividade
trófica, continuamente transportado pelo axônio, deve estar tambem envolvido.
Músculo ideal:
Para um funcionamento perfeito, o músculo deveria ser apto a desenvolver tensões que
variassem em todas as intensidades de contração, com velocidades apropriadas a cada
movimento, com economia máxima de energia, com controle contínuo sobre sua atividade e
sem desenvolver fadiga. Um músculo homogêneo não pode apresentar todas estas
características, porem músculos com tipos diferentes de fibras podem apresentar um
desempenho mais próximo do ideal.
Tipos de fibras musculares:
A- grandes, brancas, com poucas mitocôndrias
B- de tamanho médico, com mitocôndrias na periferia
C- pequenas, ricas em mitocôndrias
A densidade de capilares nos espaços intersticiais é proporcional ao número de
mitocôndrias nas fibras. Músculos pálidos ou brancos contem menos mitocôndrias e menos
capilares, e a redução da irrigação sanguínea é tambem responsável pela palidez do
músculo. Os músculos vermelhos apresentam maior densidade de mitocôndrias e alta
vascularização (são encontrados, por exemplo, no dorso).
Os músculos pálidos tem maior vulnerabilidade à fadiga, possivelmente pela menor
irrigação e menor número de mitocôndrias etambem por estarem relacionados a moviemtnso
finos e contínuos (por exemplo, musculatura ocular extrínseca).
As fibras rápidas seriam recrutadas em primeiro lugar numa contração muscular. À
medida que a contração se processa, as fibras lentas vão se tornando ativas, de forma
graduada. As maiores unidades motoras entrarão em ação quando um grande tensão for
solicitada. Na descontração ocorre o inverso: as últimas unidades a entrarem am ação
são as primeiras a se tornarem inativas.
Esta contração ordenada promove economia de energia e máximo de trabalho. O controle
desta contração é obtido pelos receptores musculares e pelo controle nervoso da
motricidade.
Receptores musculares:
Fusos:
Estruturas complexas, compostos de 4 a 10 fibras musculares estriadas envoltas, em sua
porção mediana, por uma cápsula de tecido conjuntivo contendo líquido. Esta cápsula
isola assim as fibras em seu interior (intrafusais, FIF) das fibras extrafusais (FEF). O
número de fusos é maior quanto mais delicado for o tipo de movimento requisitado para
este músculo.
As FIF e as FEF estão dispostas em paralelo e se ligam aos tendões (direta ou
indiretamente). Na região central da FIF não há miofibrilas, apenas núcleos.
Dependendo do tipo de FIF, os núcleos ficam aglomerados no centro ou então em cadeia.
Ao redor da cápsula da FIF existem ramificações espirais de fibras sensitivas
primárias. Fibras sensitivas secundárias são tambem encontradas nas FIF com núcleos em
cadeia.
As terminações primárias tem baixo limiar de estimulação, são mais sensíveis aos
estímulos fásicos de curta duração e respondem muito mais à velocidade de
estiramento. São portanto chamadas fibras de sensibilidade dinâmica.
Os estímulos sensitivos gerados nas FIF primárias seguem por fibras Ia e atingem a
porção posterior da medula, estabelecendo sinapses com motoneurônios diretamente ou via
interneurônios. Estas sinapses são sempre facilitadoras para os motoneurônios que
inervam músculos agonistas do movimento e inibitórias para músculos antagonistas.
Os estímulos gerados nas FIF secundárias seguem por fibras II até a medula e
estabelecem sinapses com motoneurônios via interneurônios. Estas sinapses são
facilitadoras para músculos flexores e inibitórias para músculos extensores,
independentemente do agonismo ou antagonsimo destes músculos naquele determinado
movimento. Músculos flexores, por definição, agem contra a força da gravidade,
enquanto músculos extensores agem a favor dela.
Com este tipo de controle motor sobre os estímulos sensitivos das fibras musculares
distendidas, o ajuste da contração pode ser feito para cada situação. Por exemplo, um
músculo contraído ao qual se coloca um peso exigindo assim um ajuste no trabalho de
contração, obterá este controle por reajuste na contração neessária. Os estímulos
que se integram na medula chegam tambem ao cerebelo e ao córtex cerebral por vias
aferentes específicas.
Assim, um reflexo miotático fásico pode ser obtido por um rápido estiramento do
músculo a nível do tendão pois haverá uma tendência reflexa da correção desta
posição rapidamente adotada. Se o estímulo de estiramento a nível do tendão não for
rápido o suficiente, a resposta rápida e ampla de ajuste não será observada.
Inervação motora dos fusos:
A inervação motora das FIF se deve principalmente aos axônios g cujos motoneurônios se
localizam na coluna anterior da medula espinal. Estes axônios g podem ser subdivididos em
dois tipos, dependendo de sua ação sobre a velocidade de variação do comprimento da
fibra muscular. Alguns axônios g aumentam esta resposta e são chamados dinâmicos.
Alguns axônios g diminuem a velocidade de variação de comprimento e são chamados
estáticos. Ainda existem axônios a e b provenientes da medula anterior e atuando sobre
as FIF e FEF.
Órgãos neurotendíneos (de Golgi):
São outro tipo de receptor sensitivo, constituídos por funas ramificações nervosas a
nível do fascículo tendíneo. Tem menor sensibilidade ao estiramento do músculo e de
certa forma agem como um dispositivo de segurança, sendo ativados quando o músculo é
distendido sob grande tensão. Na verdade, é a tensão de um músculo que determina sua
atiovação e não o estiramento em si.
Um músculo completamente em repouso apresenta uma certa tensão, ou tono, que pode ser
observado à palpação e à movimentação passiva. Em casos de lesão de nervo
periférico motor, observa-se acentuada perda do tono muscular. Isto não parece se dever
à contínua atividade de axônios g como se pensava anteriormente, mas sim a fatores
tróficos e às propriedades visco-elásticas mantidas nos músculos inervados.
Durante a manutenção do tono postural, observa-se contração de músculos
antigravitários, cujas unidades motoras se revezam continuamente em busca da postura
harmônica. Estas unidades motoras respondem à coativação de axônios a-g integrada a
nível suprasegmentar e com influências de estímulos provenientes do labirinto e de
receptores proprioceptivos articulares.
Durante o movimento voluntário, existe coativação de axônios a-g para o ajuste
preciso da velocidade e força necessárias à contração. O impulso em axônios g, de
baixa latência, determina o início rápido do movimento e a subsequente estimulação
pelos axônios a detemina a continuidade da contração. O estiramento causado por esta
contração será transmitido pelas fibras sensitivas de volta para centros de controle
segmentar e suprasegmentar, promovendo ajuste do comprimento do músculo.
Condições patológicas:
Hipertonia
Pode se manifestar clinicamente de forma espástica ou plástica.
A forma espástica caracteriza-se por exagerada resposta dos reflexos miotáticos e por
aumento da resistência muscular ao estiramento. A hiperatividade do motoneurônios g
dinâmicos faz com que respostas graduadas sejam perdidas e mínimos estiramentos
provoquem resposta máxima. Um sinal comum observado nestes casos é o sinal do canivete,
onde a distensão passiva de um músculo encontra grande resistência se opondo ao
estiramento. No entanto, se a distensão prosseguir, uma inibição brusca desta
oposição é observada e o músculo espástico pode ser distendido sem qualquer
resistência. Este sinal ocorre devido ao aumento do comprimento do músculo e à
inabilidade dos órgãos neurotendíneos em sutentar a inibição dos motoneurônios
durante a tensão.
A forma plástica é observada em algumas síndromes extrapiramidais, sendo típica da
Doença de Parkinson. A rigidez parkinsoniana se caracteriza por nítido predomínio dos
músculos flexores, num processo de disfunção da coativação a-g. Um sinal frequente na
espasticidade plástica é o sinal da roda denteada, onde durante o estiramento lento de
um músculo observa-se uma resistência crescente que bruscamente cessa para logo começar
novamente. Esta resistência parece masi relacionada ao órgão tendíneo, uma vez que a
tensão do músculo é o determinante da resistêncai e não seu comprimento.
Hipotonia
Em lesões de nervos periféricos e em certas lesões do SNC, notadamente a nível de
neocerebelo e neostriato. Esta hipotonia é devida à diminuição da atividade dos
motoneurônios g e a resposta hipotônica é máxima num estiramento é feito rapidamente.