A
pielonefrite é uma infecção bacteriana que acomete principalmente o sistema
pielocalicial, no parênquima renal. Quando se fala em nefrite intersticial, a
inflamação está limitada ao estroma renal e, de modo geral, não é de
natureza bacteriana como a pielonefrite. As nefrites estão relacionadas com o uso de drogas
( antibióticos, anti-inflamatórios não esteróides, alguns analgésicos,
alguns diuréticos). Então, quando se tem inflamação de estroma renal, temos
que relacioná-la ao uso de medicamentos.
Isso quando se fala em uma nefrite
intersticial primária (única, isolada), ou seja, há somente inflamação do
interstício, já que uma pielonefrite pode
comumente se estender ao interstício.
Infecção do trato urinário
é um termo genérico, pois abrange infecções do trato urinário inferior (bexiga e uretra), do rim (córtex e
medula), do sistema pielocalicial e
dos ureteres.
Através de exames
laboratoriais, pode-se determinar se a infecção é do trato urinário superior
ou não. A urocultura permite a identificação do agente etiológico. Já no
exame de urina, o aparecimento de piócitos é indicativo de infecção do trato
inferior; se forem detectados cilindros piocitários (lembrando das
glomerulonefrites, onde encontramos cilindros hemáticos e hialinos formados em
túbulos) o processo é dito
então do trato superior (parênquima renal e sistema pielocalicial).
Essa
característica nos permite apenas fazer uma diferenciação, sendo a clínica
mais importante. Nada impede que se tenha uma infecção alta e baixa ao mesmo
tempo, mas o que deve ser entendido é que havendo cilindros, tem-se
comprometimento superior.
A pielonefrite tem uma importância
muito grande pela freqüência e por sua clínica; em pediatria principalmente,
pois uma bacteriúria assintomática em crianças pode ser indicativo de processos congênitos que
estão mantendo essa bacteriúria podendo levar a complicações futuras; além
disso, as infecções do trato urinário podem levar a morte por falência renal
com uremia, azotemia, coma urêmico e morte.
A cistite é uma inflamação
da bexiga que se caracteriza por disúria, poliúria e uma urina de coloração
turva e fétida.
Quanto a bacteriúria assintomática,
é uma situação em que há eliminação de 105 bactérias/ml de
urina com ausência de sintomas. Nesses casos, deve-se apurar a presença de piúria;
e, se for positivo, mesmo os pacientes assintomáticos devem ser tratados,
principalmente crianças como já foi abordado anteriormente.
De modo geral
a urina e a bexiga são estéreis e, para que seja assim, há dois
mecanismos de proteção: o número de micções (mecânico) e
substância anti-aderente ( que impede a fixação de bactérias na
parede da bexiga). O homem apresenta outro fator de proteção, o líquido prostático,
que fornece IgA neutralizando os processos bacterianos. Se algo, como
anormalidades anatômicas, favorece a retenção ou o refluxo urinário, esses
mecanismos funcionam como uma barreira à instalação de infecções. Então,
como se tem esses mecanismos de proteção, o tratamento da bacteriúria
assintomática vai depender de fatores como: a faixa etária, a presença ou não
de piúria.
Recidiva é diferente de
reinfecção. A recidiva é um retorno de uma doença através do mesmo agente
etiológico que a causou e que não foi totalmente eliminado do organismo. Isso
ocorre porque, após o desaparecimento dos sintomas ou aparecimento de um efeito
colateral, o paciente abandona o tratamento prematuramente, sem que haja a cura
total da doença. A reinfecção ocorre pelo contato do indivíduo com outro
agente levando –o a outro quadro
clínico.
Então, nos casos de reinfecção
bacteriana das pielonefrites, a “culpa é jogada” no peristaltismo ureteral,
que possibilita o refluxo vésico – ureteral. Deve-se verificar a anatomia das
vias urinárias fazendo-se uma urografia excretora, que detecta o refluxo.
Nem sempre se consegue
detectar a bactéria no exame de urina, principalmente nas formas de pielonefrite crônica, pois a bactéria assume
formas “L” ou de protoplastos e se localizam em regiões que as
protegem de serem excretadas na urina.
O critério quantitativo é
que indica a existência de infecção urinária, que pode ser uma pielonefrite,
uma cistite ou outras patologias (o diagnóstico de pende de outros achados). Se
são encontradas 105 bactérias/ml
de urina tem-se uma infecção; se o número de bactérias encontradas for
inferior a 104
/ml de urina, não se caracteriza como infecção, principalmente em
mulheres (no puerpério), paraplégicos. Entre esses valores, trata-se de uma
bacteriúria assintomática que deve ser analisada segundo os critérios já
mencionados (de faixa etária ...). Por outro lado uma bacteriúria de 104/ml
de urina com sintomatologia deve ser tratada como infecção.
A pielonefrite aguda é a
infecção bacteriana no sistema pielocalicial (cálice, bacinete), com
manifestações de abscessos, congestão vascular e áreas de infiltração
intersticial de líquidos.
Sua etiologia se deve em
85-90% dos casos à Escherichia coli
proveniente do trato intestinal do próprio indivíduo. As ocorrências
intra-hospitalares são de 10 a 15% dos casos e são causadas por Pseudomonas,
Proteus, Enterococcus, Cândidas. Estas últimas ocorrem em situações
especiais como em indivíduos diabéticos, imunodeprimidos, em uso prolongado de
antibioticoterapia.
A infecção do sistema
pielocalicial se propagam por 3 vias:
·
Ascendente (1) refluxo da urina retida (o
que favorece a proliferação bacteriana) a partir do trato urinário inferior
passando pelo ureter; (2) pela
introdução de sondas;
·
Hematogênica: relacionada, principalmente,
com a endocardite e também com infecções de outros locais, já que os rins são
filtros e podem reter bactérias circulantes;
·
Linfática: infecções
procedentes de membros inferiores, ceco e apêndice (neste caso o rim afetado
será o direito).
Fatores que
participam da infecção :
·
Instrumentação do trato urinário:
possibilita a infecção pela via ascendente, são eles: catéteres “de
demora”, na medida em que traumatizam o tecido expondo a área ou, ainda, são
meios de transporte p/ as bactérias;
·
Obstrução dos ureteres (hiperplasia de próstata,
compressão uterina dos ureteres, tumores pélvicos, cálculos e distúrbios
neurogênicos). Isso ocorre pela retenção de urina, favorecendo a proliferação
de bactérias.
·
Refluxo vésico-ureteral: facilita a passagem de bactérias da bexiga p/ o rim. Ocorre por
mecanismo esfincteriano de falência (daí a importância de se fazer a
urografia excretora) , ou, até
mesmo, em pessoas anatomicamente normais que por algum distúrbio funcional têm
refluxo vésico-ureteral .
·
Idade e sexo do paciente: no primeiro ano de
vida os homens têm mais distúrbios genito-urinários que as mulheres;
e, passado o primeiro ano de vida até os 50 anos, as mulheres são as mais
acometidas desses distúrbios (na proporção de 9:1). Após os 50 anos, se
forem comparados homens prostáticos e mulheres na mesma faixa etária, os
homens superam as mulheres.
·
Vulnerabilidade da medula renal à infecção:
os glomérulos encontram-se no córtex e seus mecanismos de lesão são em sua
maioria imunológicos, isso porque o córtex é protegido, é bem vascularizado,
tem mecanismos próprios de evitar as infecções; já a medula é hipoxigenada,
tem alta concentração de amônia (o que favorece os mecanismos bacterianos e
diminui os fatores de defesa), tem um ambiente ( amônia e hiperosmolaridade)
que favorece a forma de protoplastos das bactérias até que o ambiente mude e
favoreça sua proliferação para o retorno da infecção.
·
Doenças que predispõe a pielonefrite:
diabetes, gravidez, nefroesclerose (por processo hipertensivo de longa evolução)
com espessamento das artérias e
arteríolas renais e conseqüente isquemia favorecendo a ação bacteriana,
bexiga neurogênica (incapaz de eliminar todo o volume de urina) resultado de
diabetes ou não.
A mulher é mais acometida de
infecções do trato urinário, isso devido a uretra que é mais curta, a
proximidade da uretra com o ânus, ao trauma imposto pela relação sexual
(cistite de lua-de-mel), a falta de proteção imunológica na secreção de
lubrificação vaginal (que no homem corresponde à IgA do líquido prostático)
e gravidez onde o alto nível de progesterona (20x do normal) reduz o
peristaltismo do ureter, interfere na ação dos leucócitos; e, ainda, o peso
do útero sobre os ureteres.
O diabetes favorece pela
hiperglicemia (meio de cultura p/ bactérias); ineficiência leucocitária;
vasculopatia que favorece a deposição de substância hialina na parede,
diminuindo a luz do vaso, levando à isquemia e favorecendo a infecção; e a
neuropatia (bexiga neurogênica).
Os achados clínicos:
·
Febre alta (39-40º);
·
Dor lombar;
·
Polaciúria (n.º de micções aumentado) e poliúria
(na crônica);
Em caso de infecção alta
acompanhada da infecção baixa, pode ocorrer cistite, disúria e urina turva e
de odor ativo.
Em
laboratório:
·
Piúria;
·
Hematúria pequena;
·
Proteinúria se houver é discreta;
·
Bacteriúria (cilindros piocitários);
·
Anemia;
·
Leucocitose com desvio p/ esquerda (formas jovens
presentes);
·
VHS elevada (velocidade de hemossedimentação);
·
Algumas pessoas apresentam náuseas e vômitos.
As formas agudas de
pielonefrite são a papilite necrotizante e a pionefrose. A papilite
necrotizante é uma complicação que ocorre em três classes de pacientes: diabéticos,
prostáticos e nos que fazem uso excessivo de analgésico. A outra forma de
apresentação é a pionefrose.
A pielonefrite crônica pode
existir sem que a bactéria seja detectada na urocultura, como já foi
comentado. A etiologia é a mesma da pielonefrite aguda, mas o tempo de infecção
é mais prolongado levando o rim a um processo crônico. Na patogenia da
pielonefrite crônica temos uma situação obstrutiva, associada ao processo
bacteriano, e outra não obstrutiva em que não é esclarecida a participação
bacteriana.
Na pielonefrite aguda o rim
está de tamanho normal ou ligeiramente aumentado; já na crônica, o rim
encontra-se diminuído e com cicatrizes grosseiras em sua superfície. Quando os
dois rins são acometidos ao mesmo tempo, a redução de volume e distribuição
das cicatrizes não são necessariamente iguais como na glomerulonefrite crônica
em que se tem uma “imagem espelho” dos dois rins.
A nível microscópico, o que
se tem é uma tireoidização, ou seja, a deposição maciça de substância colóide
dentro dos túbulos dilatados – dando impressão de que se está olhando uma
tireóide, mas o que diferencia é a presença de glomérulos com uma “faixa
rosa maciça” em volta, a fibrose periglomerular. Há também um infiltrado
inflamatório representado por linfócitos, plasmócitos, histiócitos que
caracterizam as inflamações.
Entre os achados morfológicos
e a clínica, tem-se que o rim entra em falência e não consegue concentrar a
urina a qual se apresenta com baixa densidade. Com isso, o
indivíduo apresenta polidipsia, hipertensão pela ativação do sistema
renina-angiotensina-aldosterona, com saída de Na+
.
Dentre os principais achados
clínicos da pielonefrite crônica tem-se:
·
poliúria com nictúria;
·
desidratação;
·
polidipsia;
·
perda de sais;
·
hipertensão arterial;
·
quadro de insuficiência renal progressiva – ao
contrário da pielonefrite aguda que tem curso geralmente benigno .
E, no laboratório:
·
proteinúria em torno de 2g/dia;
·
cilindros piocitários;
A hipertensão arterial
favorece o depósito de substância hialina na parede dos vasos, ou seja, faz
uma hialinose dos pequenos vasos, gerando a nefroesclerose (proporciona
isquemia). Com isso, deveríamos pensar que a hipertensão leva a uma
pielonefrite, mas o que ocorre é o contrário. O que demonstrou isso foi
realização de nefrectomia bilateral, onde se faz a substituição dos rins
doentes por rins normais. Se a natureza da pielonefrite fosse a hipertensão, o
indivíduo continuaria hipertenso, mas a realidade nos mostra o contrário.
Quando os rins são substituídos, a hipertensão desaparece.
A criança com pielonefrite
que não é tratada pode evoluir para a forma crônica e fazer parte do grupo
dos hemodialisados e candidatos à nefrectomia.
O adulto está mais
relacionado com a forma crônica, gerando hipertensos. Pode ser o elemento
inicial para o desenvolvimento de infecções extra-renais. E, durante a
gravidez, tanto a mulher quanto o
feto podem ser afetados, devido à hipertensão